Tradição (do latim tradere
= "entregar, passar adiante") é a continuidade ou permanência de uma
doutrina, visão de mundo, costumes e valores de um grupo social ou escola de
pensamento. Não há grande problema em se manter a tradição, atitude,
aliás, incentivada por apóstolos e discípulos iniciais com relação às verdades
do evangelho que haviam aprendido do próprio Senhor Jesus e que precisavam
divulgar. No entanto, o grupo que aparece como “judaizantes” não estava
tentando defender as verdades do evangelho, mas proteger um grupo especial de
viúvas, que eram puramente do povo judeu nascido na Palestina. O mesmo grupo
vai aparecer em outra circunstância em Atos 15: “Então, alguns que
tinham descido da Judeia ensinavam assim os irmãos: Se vos não circuncidardes,
conforme o uso de Moisés, não podeis salvar-vos.” O problema era
atrelar o evangelho de Cristo do Novo Testamento ao judaísmo, religião dos
judeus naqueles dias. Havia naquele grupo uma ideia da permanência da visão de
mundo judaica sobre a cristã.
Visão de mundo, ou
cosmovisão, é um conjunto de suposições e crenças que alguém usa para
interpretar e formar opiniões acerca da sua humanidade, propósito de vida,
deveres no mundo e questões sociais. Todo ser humano possui uma
cosmovisão. Aquilo que cada pessoa é, o que defende, o que vive, é resultado da
cosmovisão que dirige sua vida. Há uma grande variedade de cosmovisões ao longo
da história e atualmente. Há ainda uma Cosmovisão Cristã, que influencia muito
a maneira em que a pessoa vê a Deus. A cosmovisão teísta crê em um Deus
infinito e pessoal, que existe além do universo, que criou todas as coisas e
sustenta tudo de modo sobrenatural. A Modernidade criou a cosmovisão chamada deísta,
visão naturalista que vê Deus além do universo, mas não nele, não interagindo
sobrenaturalmente com aquilo que criou. O ateísmo afirma que
não existe nenhum Deus além do universo físico, formado por matéria autossuficiente.
O panteísmo defende que Deus é todo o universo, não havendo um
criador distinto: criador e criação são a mesma realidade; universo, matéria,
pessoas, tudo é Deus. O politeísmo crê que existem muitos
deuses no mundo e além dele, influenciando a vida das pessoas.
O Cristianismo
entrou inicialmente em contato com o politeísmo grego; é só lembrarmos Paulo no
Areópago. Além da cosmovisão politeísta, havia a cosmovisão formada pela
filosofia grega, elaborada a partir de cinco séculos antes da vinda de Cristo.
No seu início, a Igreja Cristã, sem grandes estruturas de sustentação, entrou
em confronto direto com essas visões, que defendiam pontos de vista
conflitantes com o evangelho.
Ao longo da
história, tradição e renovação tem-se digladiado, existindo ainda
entre elas a heresia. Afinal de contas, o que é ser tradicional ou renovado
como cristão hoje? O que seria “tradição” de acordo com a
Bíblia? Existem tradições humanas e tradições divinas. As
humanas não passam de usos, costumes e convenções sem nenhum apoio nas
Escrituras. Hinário, instrumentos musicais nos cultos, roupas, comidas, jejum,
modos de orar, mulher com ou sem véu ou cabelo comprido, homens e mulheres
sentados juntos ou separados, uso da tecnologia na igreja são opções unicamente
da tradição humana, ligadas aos “relativos do homem” e não aos “absolutos de
Deus”. Jesus condenou as tradições religiosas humanas, especialmente quando
elas invalidam ou contrariam aquilo que Deus ordenou, como o que disse e foi
registrado por Marcos: “Porque, deixando o mandamento de Deus, retendes a
tradição dos homens, como o lavar dos jarros e dos copos, e fazeis muitas
outras coisas semelhantes a estas”.
Por outro lado, os
adeptos da renovação acabam por vezes a tentar relativizar os “absolutos
de Deus”, atitude, aliás, bem pós-moderna. Nem todas as igrejas ditas
“renovadas” podem ser consideradas de fato “espiritualmente renovadas”. Na
realidade, muitas passaram a adotar doutrinas estranhas ao Novo Testamento,
como a Teologia da Prosperidade, o culto transformado em show, a unção do riso,
a “queda no espírito”, o neojudaísmo, a autoajuda em lugar da Palavra de Deus,
a confissão positiva, dentes de ouro, entrevistas com demônios, maldição
hereditária, venda e veneração de objetos santos ou consagrados e outras
inovações. Tais coisas não passam de outros evangelhos ou de falsas
revelações, frutos da apostasia profetizada para os últimos tempos.
Existem, portanto, erros e acertos em ambas as partes, tanto no campo tradicional quanto no renovado. O pastor Luiz Sayão afirma: “Há grupos perdendo o equilíbrio teológico… no legalismo, no misticismo desenfreado ou no tradicionalismo irrefletido, entre outros problemas”. Biblicamente falando, boa parte da discussão sobre igreja tradicional ou renovada não tem sentido. Não é prudente nem correto polarizar a questão de forma radical. Regras estranhas por vezes tornam-se “padrão de espiritualidade”, como usar (ou não) paletó e gravata, bater ou não palmas, usar ou não barba, ouvir música mundana, usar roupas ou penteados específicos, limitar ou uso de instrumentos musicais nos cultos e muitas outras.
É preciso reconhecer que servimos a um Deus absoluto, com verdades imutáveis e inspirador de uma tradição apostólica que precisa ser mantida a todo custo. Como seres humanos, vivemos em um mundo mutável e a pregação e vivência do evangelho precisa ser relevante para o século no qual vivemos. Sejamos sal neste mundo apodrecido e luz para uma humanidade em trevas. Que a tradição e a renovação andem juntas para honra e glória do nosso Deus, respeitando sempre a sua vontade e a sua Palavra.