segunda-feira, 13 de julho de 2020

21. A REFORMA SE PRENUNCIA


"Os sistemas humanos nascem, florescem e declinam porque os processos do tempo têm seu próprio julgamento.  Instituições que à primeira vista parecem meritórias, muitas vezes transformam-se em ruínas porque o tempo se encarrega de mostrar suas falhas" (Herbert Butterfield). Foi o que ocorreu no final da Idade Média com o papado e o seu legado religioso. "Avignon" e "o Grande Cisma " revelaram o abuso do poder: com o tempo, a natureza humana transforma o que é bom em algo abusivo. O francês Pedro Valdo, o inglês John Wyclif e o tcheco Jan Hus denunciaram um abuso de poder do Catolicismo, prenunciando a reforma maior por vir.

No século XII surgiu o movimento iniciado por Pedro Valdo, de Lyon, na França. O movimento foi fundamentado na Bíblia. Valdo, rico comerciante da cidade, distribuiu sua fortuna e devotou-se ao evangelho. Com voto de pobreza, seus seguidores, os “Pobres Homens” de Lyon, viajavam e pregavam ao povo, denunciando os erros da igreja romana. Perseguido, seu movimento se refugiou em diferentes regiões da Europa. No século XVI, os Valdenses aderiram à Reforma calvinista. Hoje em dia são um ramo do protestantismo ainda existente na Itália.

John Cliff viveu e trabalhou na Universidade de Oxford, na Inglaterra, na segunda metade do século XIV. Ele discutia em sua época de quem era o senhorio sobre os homens, de Deus, ou do papa; se era de Deus, qual deveria ser o papel da igreja no contexto. Wyclif defendia a liberdade espiritual do justo, num "domínio baseado na graça". Defendia um “papado bíblico”, sem ouro nem prata, em uma vida de pobreza. "Cristo é a verdade", afirmou ele, "o papa é o princípio da falsidade". Wyclif opôs-se à maioria dos dogmas católicos e com isso prenunciou a Reforma por vir. Ao se opor à transubstanciação, ele foi afastado de Oxford. Buscou então pregar para a população do campo e das vilas, usando uma tradução bíblica do latim para o inglês que havia feito; criou então, por inspiração de Francisco de Assis, os lolardos (ou “resmungões”) sacerdotes pobres que saíam pregando pelas regiões inglesas. Morreu afastado de Oxford no final do século XIV.

Um ano antes da morte de Wyclif, o Reino da Boêmia se uniu em um casamento ao da Inglaterra e as Universidades de Praga e Oxford iniciaram um intercâmbio de estudantes. Através desse intercâmbio, Jan Hus (1373-1415), reitor na Universidade de Praga, tomou contato com a obra de Wyclif e adotou suas ideias, começando a criticar os abusos do poder do papado através da Capela de Belém, onde ministrava. Hus atacou inclusive a venda de indulgências de sua época. O movimento cresceu, gerou oposição de Roma, que determinou a excomunhão de Hus. Atendendo a um convite do Imperador, Hus foi ao Concílio de Constance, tendo sido preso, acusado de heresia, submetido à Inquisição e condenado. Não se retratando se suas ideias, ele foi executado na fogueira; o dia era 6 de julho de 1415. Tendo desempenhado um importante papel na história literária tcheca, hoje sua estátua pode ser vista em uma praça de Praga. Seus seguidores ficaram conhecidos como Hussitas. O movimento sobreviveu como igreja independente, a “Unitas Fratrum”, ou “Unidade dos Irmãos”, com os morávios, os precursores das modernas missões mundiais para expansão do evangelho, a fim de que ele alcance os confins da terra.

Consta que, antes de morrer, Hus (cujo significado em língua checa é “ganso”), teria dito algo como: “Hoje vocês assam um ganso na fogueira mas, daqui a cem anos, aparecerá um cisne que não poderá ser calado”. Se isto for verdade histórica, a frase foi profética, pois, no dia 31 de outubro de 1517, pouco mais de um século após Hus, Lutero divulgaria suas 95 teses na Universidade de Wittenberg, na Alemanha, no início da Reforma Protestante. O que Hus viu como um cisne, o papa que excomungou Lutero chamou de “um javali selvagem que devastava os jardins do Senhor”. Grande foi a devastação provocada pela Reforma no desvio cristão promovido por Roma e prenunciada por Wyclif, Hus e outros.

ÍNDICE

Introdução 1.        O século apostólico 2.        Expansão, perseguição e defesa da fé 3.        Acusações e perseguição 4.        ...