sexta-feira, 10 de julho de 2020

32. RACIONALISMO

Ao longo da história, o homem foi evoluindo na forma de se organizar e de pensar sobre a sociedade. Durante a pré-história, o objetivo era a manutenção da sobrevivência. Na Idade Média, voltava-se para a religiosidade, com a Igreja Católica monopolizando o pensamento, a ação e a vida das pessoas. Na Modernidade, um dos momentos mais importantes foi o Iluminismo, no chamado Século das Luzes.

Do século XVI ao XVIII, no contexto político e social da época, vigoraram os sistemas absolutistas centralizando o poder no rei, que mandava prender ou matar os opositores. O Iluminismo pregava a razão como melhor caminho para atingir a liberdade, representando uma reação de oposição às influências da Igreja Católica, às estruturas feudais e à supremacia da monarquia. O Iluminismo surgiu num primeiro momento após a Reforma Protestante, forçando definição religiosa em três segmentos cristãos: católico, luterano e reformado (ou calvinista). Esse período se caracteriza como revolta contra a mistura de fé e poder, numa época que trouxe uma revolução intelectual, uma maneira nova de se olhar para Deus, para o mundo e para si mesmo, com o surgimento do secularismo. Substituiu-se a autoridade medieval da igreja e o foco protestante da Bíblia pela razão humana: trocou-se a fé pela razão.

A preocupação básica do ser humano não era mais a vida eterna futura, mas a felicidade e satisfação neste mundo, buscando o que registrou na sua época o Barão von Houbach, ao desejar que o homem "se torne um ser virtuoso e racional, que não fracasse em se tornar feliz". A Renascença via o homem, não como o pecador decaído da Reforma, mas de forma positiva, como ser racional capaz de resolver problemas, sentimento que cresceu durante o Iluminismo.

Entre os anos 1550 e 1650, tivemos o século da intimidação aos conflitos religiosos, com a guerra civil inglesa, a perseguição aos huguenotes na França e a Guerra dos 30 Anos na Alemanha. Isso representou oposição ao poder dos clérigos e repúdio à heresia ou ao misticismo. O preconceito religioso parecia ser mais perigoso que o ateísmo. No século XVI e XVII, a ciência colocou o homem diante de um tempo de paz e harmonia, começando por Copérnico e o sol como centro do sistema, passando por Kepler e a terra girando em torno do sol, e atingindo Galileu com o telescópio e a nova visão do universo. O mundo universal medieval de anjos e demônios foi substituído por um universo com leis físicas e matemáticas. "A natureza e as leis da natureza escondem-se na noite; Deus disse; 'Haja Newton!' E tudo se fez luz". Esta afirmação de Alexander Pope está presente no túmulo de Newton. Passou-se a crer então que o homem tem capacidade de encontrar a verdade por seus sentidos e razão: é o racionalismo.

A cosmovisão do homem europeu mudou: a visão bíblica e agostiniana de homem pecador dependente da graça de Deus passou para o ser humano racional dependente do seu senso comum. O Cristianismo no início tentou criar uma versão que aceitava algumas verdades pela razão (a existência de Deus, por exemplo) e outras pela fé (como a ressurreição de Cristo). Embora mantendo a importância da fé, o Deus de John Locke é diferente do que é apresentado no Êxodo ou no Novo Testamento: sem mistério ou emoções, o modelo de Locke é produto de provas racionais. Para ele, as revelações mostram o caráter racional do Cristianismo: crer no messianismo de Cristo e comportar-se eticamente, que era o que Jesus e os apóstolos pregavam, ambos com bases racionais.

A primeira geração do século XVIII tinha pouca ligação com o passado cristão e deixou de lado a revelação, crendo que mitos e milagres contrários à razão não são verdadeiros. Criou-se o deísmo, a aceitação da existência de um ser superior que, tal como o Supremo relojoeiro, criou seu relógio, deu corda nele e deixou-o funcionando sem qualquer interferência. Voltaire e o enciclopedista Diderot, na França, bem como os pais da nação norte-americana (Washington, Jefferson, Franklin e outros), eram deístas. Procuravam ensinar os homens a valorizar a razão, aceitando como verdade apenas o que pudesse ser verificado e provado. O Catolicismo, fechado em si mesmo desde a Contrarreforma, refutou o discurso deísta e proibiu seus livros; as denominações protestantes tentaram dialogar com o deísmo, às vezes vencendo, mas muitas vezes perdendo a batalha e seus soldados.

O racionalismo começou a fazer parte da história da Igreja, mudando sua forma de ser, de pensar, de crer e de exercer sua fé no Deus do Antigo e do Novo Testamento. Um Deus sem ira, um homem sem pecado, o Reino dos Céus sem julgamento, o ministério de Cristo sem cruz: esta foi a tese racional que o Cristianismo enfrentou diante das mudanças que a Modernidade impôs ao mundo, principalmente em sua faixa ocidental.

O “Século das Luzes” opõe-se à “Idade das Trevas”, nome dado ao período medieval pelos participantes do Renascimento. Iluminismo, racionalismo, cientificismo, positivismo, materialismo e outros “ismos” fazem parte da utopia criada pela Modernidade, crendo que o ser humano, por seus próprios meios, seria capaz de resolver todos os problemas do mundo, de quaisquer naturezas. No século XXI, a Modernidade Líquida, também chamada de Pós-Modernidade, mostra o que aconteceu após todas essas mudanças: a Idade Moderna fez-se água, derreteu, e a frustração com tudo isto tem sido muito grande.

ÍNDICE

Introdução 1.        O século apostólico 2.        Expansão, perseguição e defesa da fé 3.        Acusações e perseguição 4.        ...